segunda-feira, 26 de outubro de 2009

FALTANDO PROFESSOR...

Falta de professores no Estado atinge várias disciplinasPara um aluno de escola estadual, não é nada fácil competir com estudantes de colégios privados em um vestibular. Geralmente, a formação básica do primeiro é mais deficiente e a estrutura disponível para o segundo é mais eficiente. Isso quando ambos contam com condições semelhantes, pelo menos do ponto de vista de acesso aos conteúdos. Agora, se a disputa já pende para um lado, imagine quando um desses lados, o mais fraco, não conta sequer com um item básico na educação: o professor.Em disciplinas como Química, Física, Matemática e Biologia, muitas escolas de Ensino Médio do Rio Grande do Norte não possuem professores. E a perspectiva de pôr fim ao problema não é das melhores, uma vez que do último concurso realizado pela Secretaria Estadual de Educação, em 2005, praticamente só restam aprovados a serem chamados para Natal e Mossoró. Os demais 165 municípios vão depender da boa vontade desses profissionais em aceitar trabalhar fora de suas cidades, do aumento da carga horária dos atuais educadores, ou da contribuição dos estagiários, pois não há previsão de novo concurso.Enquanto isso, a realidade em muitas salas de aula é igual à da estudante Fernanda Larissa Costa, de 18 anos, aluna da Escola Estadual Alfredo Mesquita, em Macaíba. As lições de Química que a jovem recebeu em 2009 não completam os dedos da mão. Um professor apareceu no meio do ano, mas logo foi embora. Pior, o problema não ocorre somente em 2009, no pré-vestibular, mas desde o primeiro ano do Ensino Médio. Resultado: adiado o sonho de uma universidade. "Não vou fazer vestibular este ano, não tenho condições, só no próximo, quando fizer um cursinho. A gente não tem a menor chance contra os estudantes de escola particular", lamenta a aluna. A realidade é a mesma de sua colega de turma, Juliana Pacheco, 18, que também não contou com professor de Química em nenhum dos três anos do Ensino Médio. Já outra aluna do Alfredo Mesquita, Keinia Monalisa, 18, decidiu enfrentar o desafio ainda em 2009.A estudante que sonha ser aprovada no curso de Medicina da UFRN, frequenta cursinhos particulares de outras disciplinas e apela para a con-tribuição de um amigo, quando se trata do conteúdo de Química. "Ele me ajuda, pois só tive algumas aulas dessa matéria este ano", reforça.O diretor do colégio, José Pinheiro Borges, reconhece o grande prejuízo dos estudantes em não contarem com uma disciplina durante praticamente todo o ano. "Aluno de escola pública já tem dificuldade em competir, mesmo com todos os professores", lembra. De acordo com ele, alguns estagiários che-gam a assumir a vaga dos efetivos, mas como passam vários meses trabalhando até receber o primeiro salário, terminam desistindo.E o problema não se resume à disciplina de Química. "Em informática, nós temos uma sala com computadores, mas nenhum professor. Quem dá aula é um aluno que sabe um pouco mais, ou um 'amigo da escola'. É lógico que eles ajudam, mas não é o ideal, pois o ideal seria termos o professor específico."
Cursos ampliam formação de professores no interiorA União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) é presidida no Rio Grande do Norte pelo secretário de Extremoz, Domingos Sávio de Oliveira. Em seu entender, o Governo do Estado ainda não vem aproveitando devidamente as possibilidades abertas no Ensino Superior, com a ampliação dos cursos de licenciatura em todo estado, ou mesmo a oferta de graduações semipresenciais."Há também a chamada plataforma Paulo Freire, que oferece até mesmo uma segunda formação aos professores. É óbvio que isso não resolve, mas é um paliativo onde haja profissionais com horas sobrando", acrescenta Domingos Sávio. Atualmente, ele afirma que grande parte dos professores na ativa já conta com licenciatura, o que é um avanço, mas ainda assim há vagas não preenchidas em dezenas de municípios, principalmente em disciplinas como Química e Física. O presidente estadual da Undime defende a discussão entre estados, municípios e governo federal, de modo que fique clara a responsabilidade de cada ente para solucionar o problema. "Já temos dificuldades de falta de professores e ainda surgem algumas sandices, como terem colocado aqui em Extremoz aulas de Filosofia (comumente do Ensino Médio, responsabilidade do Estado) para os alunos do Ensino Fundamental", critica.Domingos Sávio lembra que problemas comuns exigem soluções conjuntas, mas reconhece que a grande saída no momento seria mesmo a abertura de um novo concurso público. Há 22 anos trabalhando na educação, ele considera que as condições hoje são melhores para quem decide ensinar. "Algumas conquistas como o piso nacional, a articulação dos planos de carreira e a valorização da formação contínua vêm melhorando esse quadro e incentivando mais gente a fazer as licenciaturas, sem contar o processo de interiorização das universidades."Instituições de Ensino Superior como o Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia (IFRN), a Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA), a Universidade Estadual (UERN) e a própria UFRN têm investido na abertura de polos pelo interior, ou na oferta de cursos a distância. Em ambos os casos, as licenciaturas em Química, Física, Matemática e Biologia estão entre as primeiras opções a serem oferecidas.
Problemas começam no Ensino FundamentalAs disciplinas de Química, Física e Biologia são uma espécie de continua-ção, no Ensino Médio, da disciplina de Ciências, integrante do Ensino Fun-damental. No entanto, o problema da falta de professores não diferencia os níveis de ensino. Desde o começo do ano, os estudantes da Escola Estadual Doutor Otaviano não contam com professor efetivo de Ciências. "Sou eu quem estou ministrando essas aulas", confirma a diretora da escola, Dalvaci Pinheiro.Ela diariamente tem de deixar suas funções na diretoria para evitar que os estudantes terminem o ano sem o con-teúdo da disciplina. "Tivemos um estagiário no primeiro bimestre, mas ele desistiu e não conseguimos mais ninguém. Já fui na UNP, na UFRN, mas não tem quem queira vir, por causa do deslocamento de Natal até aqui", confirma. O problema na escola, porém, não se limita a Ciências. "As aulas de Educação Física são dadas por um auxiliar de serviços gerais. A parte prática, é claro, porque a teórica ele não tem condições de dar", observa Dalvaci Pinheiro.